“Filhinhos, guardai-vos dos ídolos! Amén.” (I João 5:21) 

O apostolo João foi o único apostolo que morre de velhice asilado na ilha de Patmos! Já velhinho, nas suas cartas, ele faz um resumo do Evangelho de um modo fantástico. Ele começa por dizer que foi testemunha do verbo que se fez carne: “o verbo esteve entre nós”, ele tocou nele, teve uma experiência sensorial e nos exorta a ter a mesma experiência a nível espiritual, tendo comunhão com os irmãos, com o Pai e com o Filho. Ele diz que quem não ama, não conhece a Deus, porque Deus é amor, quem diz que não peca é mentiroso, mas quem confessa o seu pecado é perdoado, se pecarmos temos um advogado para com o Pai, Jesus Cristo, o justo, ele é a nossa cobertura, nossa propiciação pelos nossos pecados. Quem ama o justiça e anda na verdade tem a vida eterna, quem ama o seu irmão anda na luz e nele não há escândalo, mas quem não ama, anda nas trevas. Devemos nos purificar permanecendo em Cristo, mas quem ama a iniquidade tem o diabo como pai, devemos ter cuidado com os que têm o espírito do anti-Cristo e dos falsos profetas, exortando a todos à fé em Cristo e termina a dizer: “Filhinhos, guardai-vos dos ídolos! Amén!” (I João 5:21).

Quero desenvolver este versículo, “...guardai-vos dos ídolos...” A idolatria absorve a nossa identidade (Sl.115). Existe uma idolatria primitiva e subjectiva. No caso, o apostolo João fala-nos na nossa subjectividade, guardai-vos dos ídolos. A subjectividade é intendida com o espaço íntimo do individuo, como se instala a sua opinião, na construção de crenças e valores. 

Quanto que a idolatria primitiva está ligado ao primitivismo das crenças pagãs, que hoje se chama em muitas igrejas de: “pontos de contacto”. A maioria das pessoas têm uma necessidade sensorial muito grande, querem sentir o espiritual, se não sentirem é porque não está a resultar, Deus não ouviu. É por isso que, nascem os ídolos, a construção dos ídolos, os objectos que são usados para tocar, sentir, cheirar, os lugares santos, os altares, os incensos, os templos, os rituais, as vestes, o bezerro de ouro, a serpente levantada no deserto, os óleos da unção, a imagem da virgem Maria, a agua benta, a agua de Israel, o copo de agua em oração, a rosa, o toque do pastor, do papa, o beijo na imagem de Jesus bebé, a cruz de Cristo em sangue, o sinal da cruz antes de entrar em campo ou de fazer um exame para que tudo corra bem, benzer, ferraduras atrás das portas de casa, os insensos queimados para afastar os maus espíritos, ungir com água, ungir com vinho, ungir com azeite, a mão do apostolo que mexe na agua, no vinho e no azeite, a unção apostólica, a unção do ministério, o lenço ungido, a roupa benzida, as idas a Fátima e a Aparecida ou até mesmo a Lurdes, as idas a Israel, o muro das lamentações, andar pelos lugares onde Cristo andou, o mar vermelho, o rio Jordão, o Baptismo no rio Jordão, Meca, orações nas horas certas, etc, etc. Tudo isto é a idolatria no seu estado de primitivismo que tem como base o paganismo! 

Jesus é a minha chave hermenêutica para entender as escrituras, apesar de que as escrituras dão alguns exemplos desse primitivismo, Jesus é a palavra de Deus viva, em Jesus não vejo a usar nenhum ponto de contacto. Nunca li, que Cristo tenha dito a alguém para usar um ponto de contacto para ser curado ou ser ouvido por Deus. A fé é o único modo que o justo deve viver.

Jesus disse à mulher Samaritana, que nem em Jerusalém, onde os judeus adoram a Deus e nem no monte Geresim, onde os Samaritanos adoravam a Deus adorareis ao Pai. Passaríamos a adorar a Deus em espírito e em verdade. Deus é Espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito e em verdade. (João 4) 

A idolatria está instalada nas igrejas, usando os pontos de contacto, bem como também veneramos pessoas; pode ser um pai, uma mãe, um filho, o pastor da igreja, o nome da igreja, a visão da igreja, um artista gospel, etc. 

E para piorar, vem ainda a idolatria subjectiva do individuo, as nossas crenças e valores interiores: Por vezes somos idolatras na nossa ética, da nossa moral, da nossa sabedoria, do nosso ministério, da nossa visão, dos nossos talentos, da nossa prosperidade, não há ninguém que faça estas coisas como eu, se não fosse eu o que seria desta casa, desta igreja, deste ministério, não há igreja como a nossa, etc. 

Por isso, o apostolo João dizia na sua velhice, conhecendo a Cristo como conheceu e conhecendo a vida como conheceu, dizia: “Filhinhos, guardai-vos dos ídolos! Amén.” (I João 5:21) 

Ao longo da minha vida já tive alguns ídolos, nunca tive nenhum santo ou nunca fui adepto de Maria a mãe de Jesus, ou ter um amuleto da sorte, mas tive outros ídolos, idolatrei o Benfica e o futebol, como eu adorava jogar futebol e acompanhar o Benfica em tudo, raramente faltava a um jogo e não pensava em mais nada, era doente pelo Benfica. Ao conhecer a bíblia vi que precisava de destruir esse ídolo no meu coração, hoje acompanho as noticias, vejo alguns jogos, mas na paz, se ganhou ganhou, se perdeu perdeu. No entanto, já como cristão e envolvido no trabalho da igreja a tempo integral, com o tempo passei a idolatrar o meu trabalho, a minha igreja, a visão da minha igreja e o líder da minha igreja. 

Já mencionei em um dos capítulos das minhas memórias sobre o modo como idolatrei o líder da organização que servi durante duas décadas. Mas também idolatrei o meu trabalho dentro da organização, o modo como fazia o trabalho, o reconhecimento que recebia pelo meu trabalho, aos poucos vamos nos “inchando” e isso alimenta o ego para além do razoável. Todos nós devemos ter brio no que fazemos e devemos fazer nosso trabalho bem feito, no tocante ás coisas de Deus ainda melhor, mas isso não pode ultrapassar o limite razoável, como se de repente, sem nós nada vai para frente. Quero dizer a todos os leitores que têm acompanhado estas minhas memórias; quando morremos, fique descansado que o mundo não pára! 

Era um adepto acérrimo da visão da organização, se alguém contestasse eu partia logo para a defesa, não admitia, pois na minha óptica, a visão era perfeita! Adora escrever, adorava ensinar sobre a visão. Na verdade o espírito da idolatria absorve a nossa identidade, como o salmos 115 fala: “Os ídolos deles são prata e ouro, obra das mãos dos homens. Têm boca, mas não falam, têm olhos, mas não vêem; Tem ouvidos, mas não ouvem, nariz têm, mas não cheiram...tornam-se semelhantes a eles os que os fazem, e todos os que neles confiam”

Nos tornamos cegos, surdos, sem cheiro, sem identidade, assumimos a identidade de quem adoramos e do que adoramos. É triste, mas é verdade! Nós que idolatramos o ídolo, somos parte do problema, porque alimentamos o ego do objecto ou da pessoa que adoramos. Não existindo adoradores não existe ídolos. Quanto mais adoramos o ídolo, maior se torna! É por isso que no novo testamento lemos que os apóstolos de Jesus Cristo recusavam-se a ser adorados, rasgavam os seus vestidos, como forma de protesto, só a Deus adoramos. 

Mas estes novos “apóstolos” de hoje, gostam da adoração, gostam da bajulação, gostam de sentir que a unção está neles, sem essa unção “apostólica” a igreja não vai para a frente. Hoje até a cena das “unções” dos “títulos” tornou-se em espírito de idolatria, quer em forma primitiva, quer em forma de subjectividade. As pessoas adoram os seus pastores, as suas igrejas, as suas visões, as suas convenções, as suas reuniões, os suas bandas de música gospel, os seus cantores gospel, adoram serem tocadas pelos seus líderes, autógrafos, luzes, fumos, “coloca a mão na minha cabeça apostolo, unge-me com o azeite, óleo, agua, vou buscar a unção de Deus na igreja este Domingo.”

Dão a vida pela organização e pensam que estão a dar a vida por Jesus Cristo. Mas a verdade é esta, quando mostramos o que Jesus Cristo diz sobre o assunto, quando mostramos o que o Evangelho diz, as pessoas escolhem antes seguir o “homem de Deus” e a organização que servem do que dar ouvidos ao que Jesus e o Evangelho diz. Assim sendo, não estão a dar a vida por Jesus, mas sim por um ídolo. Quando oiço pessoas a dizer; “não me interessa o que a bíblia diz, se o meu apostolo diz, é porque é verdade”. A idolatria está instalada na igreja com raízes fortes, tornamos amantes de "Fátima", pois eles dizem o mesmo: “não importa o que a bíblia diz, quem me tira os meus santinhos, tira-me tudo!”

Não é fácil sair deste espírito de idolatria. É muito difícil!

“Filhinhos, guardai-vos dos ídolos! Amén.” (I João 5:21)

 

Memórias de 30 anos de Evangelho – José Fidalgo

11/01/2020