Nós, os cristãos, se não tivermos cuidado podemos correr o risco de ficarmos insípidos. Tudo serve como arma de arremesso e para polarizar ideias, discursos e doutrinas. Quando surgiu o Covid19, várias igrejas seguiram com a decisão de se manterem abertas, com os seus cultos presenciais a funcionarem, outras decidiram fechar as portas e passaram a transmitir os seus cultos online. Logo, logo, surgiram os ataques nas redes sociais, cada um com os seus pontos de vista, mas a ofensa tornou-se a rainha da festa!

Chovem por todo lado discursos de que Deus está a castigar as nações e muito em especial os gays, entretanto alguns que assim falaram, agora estão doentes com o Covid19, será que eles eram gays? Alguns que defendem as portas abertas da igreja, presencialmente, hoje estão doentes com o Covid19 e, segundo consta, já há pastores que morreram da doença.

Surgem os discursos julgadores: “Foi Deus que o castigou...bem feita para aprender a lição... temos é de ficar em casa e obedecer ao governo”. Tudo serve para espiritualizar, para muitos Deus julga de forma exemplar, tudo tem uma razão e a mais forte é o pecado e a falta de fé. Esta tem sido a mentalidade dominante do povo que se diz cristão!

Em Lucas 13, Jesus Cristo dá-nos a todos uma grande lição. Os religiosos questionavam Jesus sobre a morte dos galileus, cujo sangue Pilatos misturara com os seus sacrifícios e também sobre a morte de outros galileus que morreram com a queda da torre de Siloé. Aquilo era noticia 24h, não se falada de outra coisa, os religiosos tinham a mente igual a de muitos hoje, diziam:“Para isso ter acontecido, é porque alguém pecou, é falta de fé, foi desobediência a Deus e ás autoridades”. E Jesus responde: “Cuidais vós que esses galileus foram mais pecadores de que todos os galileus que estão vivos, por terem morrido assim? Não, vos digo; antes, se vos não arrependerdes, TODOS de igual modo morrereis”. Jesus chuta o pau da barraca, para Jesus, o modo de morrer não é dramático, mas sim o modo de como vivemos, isso sim é dramático, pois se não arrependerdes, morrereis todos e, este morrer é morte para sempre, morrer, morreremos.

Não sabemos viver em liberdade, porque não sabemos respeitar! Mesmo em “estado de emergência” a liberdade e a democracia não pode estar em causa...há uma regra geral de confinamento, de estar em casa, mas ela não é total, porque saímos para ir às compras, saímos para trabalhar, o país não pode parar.

A decisão do presidente da republica e do presidente da assembleia da republica, que tomaram, para celebrar o 25 de Abril e o 1º de Maio é legitima. A maioria de nós ficamos desiludidos com a decisão, mas a lei permite, estamos desiludidos porque desconhecemos a lei; é como a bíblia, o povo vai atrás do que o pastor diz e não do que a bíblia diz.

A verdade é que a lei permite celebrar o 25 de Abril e o 1º de Maio, mesmo em estado de emergência. Assim como a liberdade de consciência e de religião, artigo 19 ponto 6 da lei do estado de emergência, passo a citar: “A declaração do estado de sítio ou do estado de emergência em nenhum caso pode afectar os direitos à vida, à integridade pessoal, à identidade pessoal, à capacidade civil e à cidadania, a não retroactividade da lei criminal, o direito de defesa dos arguidos e a liberdade de consciência e de religião”.

Eu, como cidadão, tenho o direito de decidir em consciência, se quero trabalhar ou não, se quero exercer o direito de culto ou não, exercer a liberdade de religião. Assim, como tenho o direito de decidir se saio de casa para ir às compras ou não. É claro que alguém tem de ir ás compras, no meu caso, sou eu mesmo. Também tenho o direito de que a saúde, a farmácia, os transportes funcionem para me servir, mesmo em tempo de emergência, posso não ter o Covid19, ter uma outra doença e o estado tem de garantir os mesmos serviços de saúde para cuidar dos cidadãos. A igreja é um serviço público e não privado, a igreja e os ministros de culto têm de estar disponíveis para servir a saúde espiritual dos cidadãos que assim crêem, a fé é um direito que não pode ser banida no estado emergência. Eu tenho o direito de entrar numa igreja e procurar um padre e um ministro do evangelho para me ajudar em tempos como este, quer online, quer presencial. Ninguém trata de doentes apenas online, não é possível.

Com isto, não estou a dizer, que a minha liberdade obrigue a outros, apesar de que em alguns casos obrigue. Por exemplo, a minha liberdade de ter comida em casa, obriga a que outros tenham de trabalhar. A minha liberdade de ter medicamentos e assistência médica, obriga a outros a trabalhar. A minha liberdade de ter assistência pastoral, obriga a que os pastores tenham de trabalhar.

Assim, pois temos a liberdade de celebrar o 25 de Abril e o 1º de Maio e provavelmente obrigará a outros a trabalhar para que as cerimónias se realizem...esta é a lei da constituição da republica. Alguém dirá: "Temos de ter bom censo". Claro que sim, mas a liberdade, enquanto a temos, devemos desfrutá-la da melhor maneira possível...

Eu decidi, em consciência, que a igreja Lighthouse vai abrir as portas presencialmente a partir do dia 3 de Maio de 2020. Isto vai obrigar-me a estar presente e organizar a sala a receber pessoas de acordo com as regras do distanciamento.

Às pessoas, cabe cada um decidir em sua liberdade e consciência.

A vida continua, se não morrermos de Covid19, com certeza que morreremos de outras coisas, o importante é o modo como vivemos e não como morremos.

18/04/2020 José Fidalgo.